10 de setembro de 2014

Futebol Global 2014/15: Diego Costa, um verdadeiro corpo estranho na seleção espanhola (análise de 3 a 9 de setembro)

Reflexão: O futebol é um jogo coletivo. Ponto assente e indiscutível. Alguns jogadores fazem-no parecer demasiado simples através da sua vasta qualidade individual e, na maior parte das vezes, conseguem facilmente desbloquear uma partidaNo entanto, esses mesmos executantes necessitam de uma equipa que os ajude a atingir a excelência. Umas formações optam por fazer uso constante da posse de bola para criar situações de finalização, outras gostam de imprimir rápidas transições para em poucos toques chegar à área contrária. Duas filosofias baseadas no mesmo: a criação de um sistema de jogo e  rotinas/dinâmicas (no fundo, o modelo de jogo). Foquemos esta reflexão no caso espanhol. 

Após a derrota por 1-0 no particular diante da França, Vicente Del Bosque afirmou o seguinte: «Construímos jogo, tivemos posse de bola, controlámos o jogo e foi um bom teste. Diego Costa mostrou o que é capaz, agora temos de nos conetar com ele, percebê-lo. Vamos melhorar. Ele trabalhou no duro e tenho certeza de que terá sucesso.» Perante isto, é natural que a divergência entre o selecionador de "La Roja" e os apreciadores de um futebol mais apoiado torne-se demasiado evidente. Analisando pormenorizadamente as palavras do treinador de sessenta e três anos constata-se que existe uma intenção para que os restantes jogadores se adaptem às características e ao estilo de jogo do seu avançado, da referência fixa ofensiva. Mas será mesmo esse o caminho mais correto? Vejamos paralelamente o caso de Cristiano Ronaldo. Quer o Real Madrid CF quer a seleção nacional constroem processos no sentido de servir da melhor forma o internacional português. Estará incorreta essa opção? Não, sobretudo porque ambos os conjuntos apresentam um modelo de jogo que privilegia declaradamente as transições, favorecendo os atributos do melhor jogador do mundo.

Com Diego Costa (na seleção espanhola) a conjuntura é outra. As características do hispano-brasileiro em nada se enquadram na filosofia de jogo dos ex-campeões mundiais. Há, portanto, um choque entre conceitos e formas de atacar diferentes. O jogador do Chelsea FC caracteriza-se essencialmente pela sua verticialidade e capacidade de finalização. Possui estatísticas interessantes (por exemplo apontou sessenta e quatro golos em cento e trinta e três presenças pelo Atlético de Madrid), foi uma peça fundamental no esquema de Simeone que possibilitou em 2013/14 a conquista da Liga BBVA e a chegada às final da UEFA Champions League e tem protagonizado um arranque fulgurante na Barclays Premier League. Além disso, está constantemente à procura de explorar a profundidade (através de bolas longas, para ganhar em velocidade aos defesas contrários) e o contacto físico (algo que já lhe valeu várias quezílias nos últimos meses). No resto, é capaz de perder muitas bolas por encontro, raramente se posiciona de forma a receber os apoios necessários e possui uma tomada de decisão fraca. Del Bosque tem de entender que uma individualidade que por si só não pensa o jogo de forma coletiva não pode subitamente obrigar a uma alteração num modelo marcadamente de posse, de construção apoiada e de envolvimento entre todos os jogadores. A Espanha saiu precocemente do Mundial 2014 devido a um conjunto de vários fatores. Um dos mais essenciais passou pela introdução de Diego Costa nos dois primeiros jogos, algo que descaracterizou a equipa em termos de organização ofensiva. Um formação que saiba efetuar uma cobertura astuta dos espaços dificulta as movimentações do internacional espanhol. Por sua vez, este tenderá a jogar mais em apoio, algo para o qual não está habilitado nem possui a qualidade técnica necessária (sobretudo a nível da receção). Terá o ex-jogador do Atlético de Madrid feito a melhor escolha quando decidiu representar a Espanha em detrimento do Brasil? Tudo depende das decisões (aposta em jovens talentos, definição do papel de Costa, etc.) que Vicente Del Bosque, um dos mais consagrados técnicos do futebol mundial, tomar no futuro a curto/médio prazo. Só então poderemos prever qual o futuro de uma seleção que teve o mundo futebolístico a seus pés nos últimos seis anos.

Jovem Promessa: Munir El-Haddadi Mohamed. Nascido a um de setembro de 1995 em San Lorenzo de El Escorial (município localizado a quarenta e sete quilómetros de Madrid) o hispano-marroquino é um dos talentos mais promissores de "La Masia" e uma aposta clara de Luis Enrique neste começo de temporada. Filho de pai marroquino e mãe espanhola, Munir desde cedo demonstrou categoria e potencial para ingressar no futebol profissional. Como tal, iniciou o seu percurso de formação como infantil no CD Galapagar, um modesto conjunto que se localizava perto da sua residência. As boas prestações chamaram as atenções dos olheiros do Atlético de Madrid, clube que não hesitou em propor-lhe um período de testes. Contudo os "colchoneros" acabaram por ceder El-Haddadi ao CF Rayo Majadahonda. Nos arredores de Madrid o jogador explodiu e apontou trinta e dois golos em vinte e nove encontros. Estes dados estatísticos despertaram naturalmente o interesse de grandes equipas como o Manchester City FC, Real Madrid CF, Rayo Vallecano, Getafe CF, CA Osasuna e o próprio FC Barcelona. Apesar de um forte disputa entre os emblemas citados, foram os catalães que com informações precisas se anteciparam à concorrência, garantindo o concurso do rapaz que sonhava um dia jogar em Camp Nou com a camisola "blaugrana". A justificação para esta aquisição é simples: Francesc García Pimienta, futuro técnico dos juvenis do FC Barcelona, ao visionar um jogo entre Rayo Brunete CF e CF Rayo Majadahonda, ficou encantado com as qualidades exibidas pelo hispano-marroquino (fez um hat-trick) e rapidamente recomendou a contratação deste prodígio para a cantera catalã. Em pleno verão de 2011, o destino de Munir El-Haddadi passava então a ser a Cidade Condal em detrimento dos arredores da capital espanhola (onde vivia e era expectável que permanecesse). Chegado à famosa academia, o jovem com então dezasseis anos cumpridos rapidamente ingressou na equipa juvenil e atravessou um extraordinário período de adaptação. Sob o comando de García Pimienta atuou predominantemente na faixa lateral (tendo como referência Pedro Rodríguez). A temporada 2011/12 culminou na perfeição para Munir: conquistou a Liga Nacional (consagrando-se como o melhor marcador do seu conjunto ao concretizar vinte e dois golos) e a Copa da Catalunha (apontou um dos tentos na vitória por 2-0 sobre o RCD Espanyol). O exercício seguinte ficou marcado pela ascensão aos juniores, embora tenha alternado com ocasionais presenças no escalão imediatamente inferior. Já a época 2013/14 foi memorável para o jovem de origens africanas. Jordi Vinyals colocou de forma definitiva Munir na equipa de juniores e este respondeu de forma convincente. Após ter estendido o contrato com o FC Barcelona até junho de 2017 (afastando os rumores de que estaria ligado a clubes como o Arsenal FC, FC Bayern Münich ou PSG), Munir realizou uma excelente campanha na UEFA Youth League e sagrou-se o melhor marcador da prova (onze golos em dez partidas). De resto contribuiu com dois tentos (um deles antes da linha de meio-campo) para a vitória dos catalães por 3-0 sobre o SL Benfica no derradeiro embate da competiçãoAdicionalmente arrecadou o campeonato nacional de juniores e estreou-se com o FC Barcelona B no futebol profissional em março do presente ano civil numa vitória por 2-1 sobre o RCD Mallorca. Como tal, ainda conseguiu alcançar quatro golos e duas assistências em onze presenças  na Liga Adelante. Indubitavelmente uma excelente forma de culminar as três primeiras temporadas ao serviço das camadas jovens do FC Barcelona e reforçar o estatuto de promessa com grande probabilidade de entrar na equipa principal "culé", algo que aconteceria futuramente. A nível internacional, Munir decidiu representar a seleção espanhola uma vez que problemas relacionados com a gestão do seu passaporte impediram jogar pela nação do seu pai. Março de 2014 foi um mês inesquecível, já que juntou a estreia na equipa secundária "blaugrana" ao debute nos U19 castelhanos. Como tal,  participou na qualificação para o Campeonato da Europa da categoria, contabilizando três golos em outras tantas partidas (frente a Dinamarca, Lituânia e Alemanha). Mas os germânicos superiorizaram-se no último jogo do grupo cinco de apuramento e impediram que a Espanha marcasse presença no certame realizado na Hungria. Recentemente Albert Celades, treinador que sucedeu a Julen Lopetegui na liderança da seleção de esperanças, convocou o executante do FC Barcelona para duplo-compromisso com Hungria e Áustria referente ao apuramento para o Campeonato da Europa U21. Após ter cumprido uma partida neste escalão, Munir rapidamente transitou para a seleção principal de "La Roja" para cobrir a vaga do lesionado Diego Costa. Foi sem surpresa que Vicente del Bosque promoveu a estreia de El-Haddadi na seleção AA frente à Macedónia no passado dia oito de setembro. Munir El Haddadi é avançado centro, embora efetue com naturalidade as três posições do ataque. Esquerdino, é equilibrado do ponto de vista físico (177 cm e 69 kg) e revela competências na finalização, velocidade e facilidade de movimentos. Tecnicamente evoluído e ágil, controla muito bem a bola e toma decisões em prol do coletivo, apesar de relevar alguma intranquilidade com o pé direito. No fundo, é mais um protótipo da enorme qualidade que é potenciada e desenvolvida em "La Masia". A geração de Rafinha, Sergi Roberto, Sandro Ramírez, Adama Traoré, Alen Halilovic, Munir El-Haddadi e Jean Marie Doungou tem tudo para dar imensas alegrias aos adeptos catalães no futuro. Após uma pré-temporada muito interessante, Luis Enrique não hesitou em conceder a titularidade a Munir. Até agora, o jovem encantou, faturou e tornou-se o futebolista mais jovem de sempre a marcar um golo na primeira jornada da liga espanhola. Bons registos para uma promessa que em meio ano ascendeu da Liga Adelante à Liga BBVA e à seleção principal castelhana. 

Facto: Com a vergonhosa derrota consentida em Aveiro perante a Albânia, a seleção portuguesa alcançou alguns recordes. Este foi o quinquagésimo jogo da "seleção das quinas" em qualificações para Campeonatos da Europa na condição de visitado. Ademais, nos últimos três jogos de estreia para Europeus (2008, 2012 e 2016) Portugal nunca venceu (somou dois empates e uma derrota). A ausência de Cristiano Ronaldo fez com que a estrela do Real Madrid CF falhasse o seu vigésimo segundo encontro desde a estreia pela equipa principal lusa em 2003. Por fim, a última derrota caseira de Portugal em jogos oficiais é datada de setembro de 2008 (derrota por 3-2 em Alvalade frente à Dinamarca).

Equipa da Semana (3-5-2): Antonis Georgallides (Chipre); Leonardo Bonucci (Itália), Nicolas N'Koulou (Camarões) e Lorik Cana (Albânia); Aiden McGeady (República da Irlanda), Ángel Di María (Argentina), David Silva (Espanha), Gareth Bale (País de Gales) e Yacine Brahimi (Argélia); Robert Lewandowski (Polónia) e Thomas Müller (Alemanha)

Frase: «Foi uma decisão difícil para mim. Queria deixar a seleção, mas o Conte veio e pediu-me ajuda. Estou feliz por o poder fazer, espero que corra bem» - Andrea Pirlo, jogador da Juventus FC, sobre o seu retorno à seleção italiana após reconsiderar a sua opção inicial.


Artigo escrito por: Ricardo Ferreira 
Imagens: biggahd1.blogspot.com / uefa.com

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